JM
Cunha Santos
Grande
parte da geração de jornalistas meus contemporâneos iniciou a carreira em plena
ditadura militar. Governadores nomeados, cidades ocupadas por intendentes,
sonhos de liberdade, a luta pela volta ao estado de Direito, pelo fim da
tortura, pela anistia, por eleições diretas. E não aprendemos a escrever a
favor de governos. O caráter e as circunstâncias nos impediam e quase tudo que
se escrevia acabava na cesta de papel ao lado dos editores e censores.
Depois
veio a democracia. A democracia, não a normalidade democrática. A especulação
imobiliária da terra, a grilagem, prisões e mortes de lavradores e lideranças
sindicais no Maranhão, a tortura, a violência policial, os menores abandonados,
o abuso de poder econômico, a corrupção. E lá estávamos nós, mais uma vez, sem
saber como se escreve a favor de um governo. A censura saiu dos quartéis e se
instalou nas redações, se tornou econômica, judicial, até virar auto-censura. E
quase tudo que a gente escreveu continuou lá, na cesta de papel ao lado dos
editores e censores.
Hoje,
quando o prefeito de São Luís, Edivaldo, representa a democracia pela qual
tanto lutamos, preferimos não atacá-lo, torcemos para que faça uma grande
administração e dê alguma paz ao povo de São Luís. E, de verdade, talvez nem
haja motivos. E se alguém nos diz, “mas ele é evangélico”. “É? E daí? Eu também
não sou mais ateu, não posso censurá-lo por uma fé que hoje, de qualquer forma,
também é minha”.
Querendo
ou não, sabemos que ele, o prefeito, também é símbolo dessa liberdade que
lutamos tanto para alcançar.
Fecha-se
o cerco, porque nós, que erguemos tantas bandeiras vermelhas, que discutimos,
quase sem entender, Marx e Engels nas universidades, assistimos no Maranhão à
primeira eleição de um governador comunista, Flávio Dino. Mas que diabos, nós
que nem somos mais comunistas temos a obrigação de escrever a favor do primeiro
governo comunista do país! Porque ele, afinal, representa o fim da última
oligarquia nacional, o último resquício do coronelismo que nos perseguiu a
todos, nos deixou em silêncio e ameaçados durante tantos anos, símbolos de uma
geração que não se conformou.
E
é esse o nosso maior dilema. De nada nos serviram tantos anos de experiência,
de nada nos serviram as faculdades de comunicação. Somos demissíveis
congênitos, porque não sabemos, não aprendemos a escrever a favor de governos
e, agora, para sermos coerentes com a história e com nossos ideais, temos dois
governos para defender.
E,
o que é pior, quase 40 anos depois, não há lugar para nós na oposição que nesse
Estado, fatalmente, se formará.
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