segunda-feira, 22 de dezembro de 2014

PAIXÃO DE NATAL EM CARNE POÉTICA

JM Cunha Santos

 


        Bateram em Deus o dia todo
açoitaram o Pai, o Filho e o Espírito Santo
o humano emporcalhado em sangue e lodo
a carne de Deus voou, Jesus comeu seu pranto
         depelado vivo à turba de beócios
que confundem missão com prazer e negócios
   Bateram, Deus, em Deus a tarde inteira
   espancaram para que não fosse eterno
e só devemos esperar que a gente carniceira
ouça de Caifás para sempre a voz no inferno
 
          Bateram em Deus o dia todo
acorrentaram o Filho em estacas difíceis
lancetaram impiedosos o coração visigodo
chicotes de urânio, pregos que viram mísseis
   na carne de Deus o ódio dos sócios
fez da crueldade séculos de sacerdócio
de um povo que bate em seu Deus solitário
rei eterno de um reino onde não se vê o rei
que escreve mandamentos em panos sudários
“Amai-vos uns aos outros como eu vos amei”
 
              Batem em Deus no século 21
não importa se carrega uma cruz radiativa
   o som do pecado é cada vez mais comum
o filho do Homem cada vez mais em carne viva
             É a mesma a dor que se descreve
os mandamentos de Deus sem espaço na Web
       Furam seu Deus com lanças eletrônicas
 o Filho chora, inerte, uma dor jamais havida
e ao contemplar impotente chacinas biônicas
     “Eu sou o caminho, a verdade e a vida”
 
        Batem em Deus no século 21
Não em qualquer rosto, só no rosto sério
Mahlala de Gutánamo não soma um mais um
que a tortura nos berços esquarteja o Império
   Na Roma hodierna é o mesmo o mal
       e grita pela fé o Cristo digital
     lavando no corpo seiscentas feridas
junto à púrpura e ao ouro onde os profetas jazem
          e se é esse o grito que suspende a vida
“Pai, perdoai-os; eles não sabem o que fazem”
 
         Batem em Deus, batem muito forte
         Pobres, ricos e homens sem salário 
     Batem tanto no Deus que superou a morte
        Batem malandros, gentios e otários
       É como se afundassem num céu abissal
       Os filhos do bem e os filhos do mal
       E o couro que voa pedindo perdão
Um corpo de sol transformado em torresmo                   
Batendo com os pés, com a alma e com a mão
     “Ama o teu próximo como a ti mesmo”  

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