Como avisou a
procuradora-geral dos Estados Unidos, a investigação do FBI que “derrubou” o poderoso presidente
da FIFA, Joseph Blatter,
não conhece limites. Os agentes analisam também a organização do Mundial de
2014 em virtude dos estreitos vínculos entre o ex-presidente da CBF Ricardo
Teixeira e o secretário-geral da FIFA, Jérôme Valcke (mão direita de Blatter),
segundo informou oEstadão com base em fontes que conhecem o caso.
As confissões realizadas por diversos delatores confirmaram a existência de
subornos prévios à designação do Mundial da África do Sul, em 2010, como há
tempo se suspeitava, e as autoridades norte-americanas revisarão a escolha das
duas próximas Copas – Rússia 2018 e a polêmica Catar 2022 –, o que poderia inclusive provocar tensões
internacionais.
Teixeira, que
presidiu a CBF entre 1989 e 2012, é o principal alvo das diversas investigações em
andamento sobre a confederação do Brasil. Mas, pelo menos até agora, ele não está na lista
de indiciados por lavagem de dinheiro e evasão fiscal divulgada pelo
Departamento de Justiça dos EUA na semana passada e que resultou na detenção de sete dirigentes em
Zurique (entre
eles, o sucessor de Teixeira, José Maria
Marin). Até o momento,
não se sabe se Teixeira será um dos “conspiradores” citados pelo FBI, cujas
identidades ainda não foram reveladas. O ex-genro de João Havelange era diretor
do Comitê Organizador da Copa do Mundo 2014 quando se exilou em Miami, em 2012,
enfrentando gravíssimas acusações que depois seriam confirmadas e atingiriam o
próprio Havelange – que perdeu sua condição de presidente honorário da FIFA e
de membro do Comitê Olímpico Internacional (COI).
Os investigadores analisam mais de mil documentos e contratos assinados
pelos organizadores nos anos prévios à realização do torneio, depois que a
candidatura única do Brasil ao Mundial (que correspondia à América do Sul) foi
preparada pelo próprio Valcke. As suspeitas sobre o Mundial 2014 somam-se à investigação do contrato de 150
milhões de dólares (cerca de 465 milhões de reais) assinado entre a Nike
(mencionada nos autos do processo como “uma empresa de material esportivo) e a
CBF na época de Teixeira, entre outros contratos. Valcke, por sua vez, nega
terminantemente a existência de condutas ilegais em supostas transações
milionárias que vieram à tona na imprensa.
Marco Pólo Del
Nero, atual presidente da CBF, abandonou Zurique às pressas um dia após as
detenções, véspera da reeleição de Blatter.Queria “responder pessoalmente” às acusações no Rio
e em São Paulo. As fortíssimas pressões sobre ele nascem de seu estreitíssimo
vínculo com Marin, formalmente acusado de receber generosas propinas por
campeonatos internacionais e brasileiros. Segundo aFolha de S. Paulo,
Del Nero assinou o balanço de demonstrações financeiras da CBF de 2014 e
participou (como vice-presidente da entidade, eleito por Marin) de pelo menos
10 dos 13 contratos comerciais que a confederação firmou desde 2012, quando seu
mentor chegou à presidência por ser o vice mais velho.
O futebol
brasileiro vive uma enorme tormenta, e Del Nero manobra sem descanso para
impedir uma revolta de patrocinadores e federações estatais de futebol. Isso o
obrigaria a apresentar sua renúncia, já pedida publicamente por personalidades como o senador Romário e Ronaldo, e promovida de forma privada por
diretores de clubes e certos dirigentes regionais em meio à frieza do Governo,
que nunca escondeu seu o pouco apreço pela direção da CBF. Dilma Rousseff já
deixou claro que a investigação sobre a corrupção na FIFA “fará bem ao futebol mundial e ao
brasileiro”.
Ainda não se sabe quem é oconspirador 12 da investigação do
FBI, e Del Nero negou repetidamente a possibilidade de que seja ele próprio.
Todo o establishment do futebol brasileiro parece de repente estar
sob suspeita, embora isso até agora não tenha afetado as competições. O
presidente convocou uma assembleia extraordinária da CBF para o próximo dia 11,
quando serão debatidas as modificações nos estatutos da entidade. Desse modo,
ele tenta conter o lobby dos clubes que buscam a criação de uma liga
independente. Neste fim de semana, algumas das principais figuras do futebol
brasileiro, como Zico e Ronaldo, vão se reunir em Berlim para a final da
Champions League. Lá discutirão os próximos movimentos e pedirão o apoio dos
patrocinadores da CBF. Zico pretende seriamente apresentar sua candidatura à
presidência da FIFA nas eleições do fim do ano e garantiu a este jornal que vai
falar quando voltar ao Brasil, a partir do dia 9.
Na quinta-feira do Corpus Christi na
Granja Comary, em Teresópolis, os jornalistas perderam o início do treino da
seleção esperando a chegada de Del Nero, que visitou os atletas internacionais
para lhes desejar sorte antes do desafio pós-Mineiraço da Copa América. O presidente da CBF cruzou o
portão sem baixar os vidros escuros de deu carro e sem dar declarações à
imprensa. Como disse um fotógrafo carioca, de todo jeito houve mais aproximação
(e foi mais barato) que no ano passado, quando ele costumava aterrissar em
Comary a bordo de um helicóptero.
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