Agência Brasil
Morreu no final da manhã hoje (14), em São Paulo, o
Cardeal Dom Paulo Evaristo Arns. Ele estava internado desde o dia 28 de
novembro com broncopneumonia, no hospital Santa Catarina. Ontem (13), o estado
de saúde do arcebispo emérito da Arquidiocese de São Paulo havia piorado ele
estava na UTI em função de problemas na função renal.
Dom Paulo tinha 95 anos, 71 anos de sacerdócio e 76
anos de vida franciscana. Ele era cardeal desde 1973 e foi arcebispo
metropolitano de São Paulo entre 1970 e 1998.
O velório terá início no final da tarde na Catedral
da Sé.
O trabalho pastoral de Arns foi voltado
principalmente aos habitantes da periferia, aos trabalhadores, à formação de
comunidades eclesiais de base nos bairros e à defesa e promoção dos direitos
humanos. O portal Memórias da Ditadura, do Instituto Vladimir Herzog, relata
parte da atuação do cardeal, que ganhou destaque já em 1969, quando passou a
defender seminaristas dominicanos presos por ajudarem militantes opositores.
Biografia
Dom Paulo Evaristo Arns nasceu no dia 14 de setembro
de 1921 em Forquilhinha (SC) e ingressou na ordem franciscana em 1939. Foi
ordenado presbítero em novembro de 1945 na cidade de Petrópolis (RJ).
Frequentou a Sorbonne de Paris, onde estudou patrística (filosofia cristã) e
línguas clássicas. Foi professor e mestre dos clérigos e chegou a atuar como
jornalista profissional. Trabalhava como vigário nos subúrbios de Petrópolis
quando foi indicado bispo auxiliar de Dom Agnelo Rossi, em São Paulo, em 1966.
Foi nomeado arcebispo de São Paulo em outubro de 1970, aos 49 anos.
Com formação em filosofia e teologia, Arns escreveu
56 livros e recebeu mais de uma centena de títulos nacionais e internacionais.
Entre seus livros mais conhecidos está Brasil: Nunca Mais, um projeto conduzido
de forma clandestina entre os anos de 1979 e 1985, desenvolvido pelo Conselho
Mundial de Igrejas e pela Arquidiocese de São Paulo, sob a coordenação do
reverendo Jaime Wright e de Dom Paulo e que retrata as torturas e outras graves
violações a direitos humanos durante a ditadura militar brasileira.
Entre outros episódios de sua trajetória,
destacam-se também sua atuação contra a invasão da Pontifícia Universidade
Católica (PUC), comandada pelo então secretário de Segurança Pública de São
Paulo, coronel Erasmo Dias, em 1977, e o planejamento da operação para entregar
ao presidente dos Estados Unidos, Jimmy Carter, uma lista com os nomes de
desaparecidos políticos.
Em março de 1973, ele presidiu a “Celebração da
Esperança”, em memória do estudante Alexandre Vannucchi Leme, morto pela
ditadura. No ano seguinte, acompanhado de familiares de presos políticos,
apresentou ao general Golbery do Couto e Silva um dossiê relatando os casos de
22 desaparecidos. Em outubro de 1975, celebrou na Catedral da Sé o histórico
culto ecumênico em homenagem ao jornalista Vladimir Herzog, morto pelo regime
militar. Anos depois defendeu o voto popular na campanha Diretas Já.
Em outubro deste ano, ele foi homenageado no Teatro
da Pontifícia Universidade Católica (Tuca), na capital paulista, pelos seus 95
anos de vida, e pela sua atuação política. A cerimônia foi marcada por relatos
de ações de Arns contra a ditadura militar, nas décadas de 60 e 70, e em defesa
dos direitos humanos. O papa Francisco enviou uma mensagem especialmente para a
comemoração. O cardeal compareceu e fez uma breve fala de agradecimento ao
final.
Posições firmes
Em entrevista à BBC Brasil, em abril de 2014, o
ativista de direitos humanos argentino Adolfo Perez Esquivel, de 82 anos,
ganhador do Prêmio Nobel da Paz em 1980, disse que foi salvo duas vezes por dom
Paulo Evaristo Arns durante a ditadura no Brasil. "Dom Paulo, certamente,
falou com autoridades do Brasil para que eu fosse liberado. Mas não sei as
gestões exatas que ele fez. O que sei é que ele não perdeu tempo em organizar
uma manifestação na porta da delegacia para me salvar. E me salvou",
disse.
O cardeal mantinha posições firmes. Em 1984 defendeu
a instalação da Assembleia Nacional Constituinte, responsável pela elaboração
de 1988 - que só viria a ser instalada em 1987. "Toda crise é momento de
mudanças qualitativas. A crise que estamos atravessando é profunda. Estamos
procurando deixar para trás uma fase pouco feliz da nossa História. A
Constituinte será ocasião de preparar estruturas para a nova etapa. Considero
essencial que ela se instale e comece o seu trabalho o mais cedo
possível", disse Arns na publicação Lua Nova: Revista de Cultura e
Política.
A palavra esperança fazia parte dos discursos do
cardeal. Na cerimônia de posse como arcebispo de São Paulo, perante cerca de 5
mil fiéis, declarou: “Venho do meio do povo desta arquidiocese a que já
pertencia, do clero a quem amo e de quem sou irmão, dos religiosos que comigo
se esforçam para serem sinal e esperança dos bens que estão para chegar, dos
leigos que entendem o serviço aos irmãos como tarefa essencial de sua
existência."
A palavra também foi dita quando soube da morte da
irmã, Zilda Arns, vítima do terremoto no Haiti em 2010: "Que
nosso Deus em sua misericórdia acolha no céu aqueles que na terra lutaram pelas
crianças e pelos desamparados. Não é hora de perder a esperança. Ela morreu de
uma maneira muito bonita, morreu na causa que sempre acreditou".
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