O traficante Luiz Carlos da Rocha, o
Cabeça Branca, completou 58 anos na última terça-feira, dia 11, numa cela de
cerca de sete metros quadrados na Penitenciária Federal de Catanduvas, no
Paraná. Longe do luxo da vida milionária, o aniversário foi comemorado sozinho
em uma cama de concreto ao lado uma pia, um sanitário, uma mesa e um chuveiro.
Comeu o prato do dia: arroz com feijão, filé de peixe à milanesa, polenta,
salada de repolho com cenoura, farofa e, de sobremesa, frutas. O bandido foi
levado para o presídio de segurança máxima no dia 4, depois de ser preso quatro
dias antes na cidade de Sorriso, em Mato Grosso, numa operação da Polícia
Federal que poderia virar roteiro de cinema. Cercada de sigilo, a ação levou um
ano e seis meses sendo planejada por um grupo restrito de apenas oito policiais
federais. Tanto zelo tinha motivo: por duas décadas, o criminoso viveu como um
fantasma, procurado pela polícia brasileira e de vários outros países como o
maior traficante de drogas da América Latina, e com o nome na difusão vermelha
da Interpol. Uma fama no submundo do crime que só pode ser comparada à de outro
notório bandido: o colombiano Pablo Escobar, morto na cidade de Medellín, na
Colômbia, em 1993.
'Pablo Escobar do Brasil'
Agindo nas sombras, ao contrário de Escobar, que
gostava dos holofotes, Cabeça Branca comandou por mais de duas décadas um
esquema de tráfico internacional de drogas responsável por abastecer
mensalmente com pelo menos cinco toneladas de cocaína, com alto grau de pureza,
países na Europa, na África e nos Estados Unidos. No Brasil, seria o principal
fomentador da guerra travada entre quadrilhas rivais de criminosos no Rio e em
São Paulo, fornecendo cocaína mais barata e sem tanta pureza para bandidos
ligados às maiores facções do país. Em mais de 20 anos de atividades no crime,
a Polícia Federal estima que ele tenha reunido uma fortuna em bens que
chegariam a pelo menos US$ 100 milhões (cerca de R$ 325 milhões) e movimentado
uma cifra superior a R$ 1,2 bilhão. Valores que transformam Luiz Fernando da
Costa, o Fernandinho Beira-Mar, e Marcos Willians Herbas Camacho, o Marcola,
bandidos classificados como barões das drogas no continente, como criminosos
pés-de-chinelo. Não há ninguém do nível de Cabeça Branca sendo procurado pela
Polícia Federal no momento.
Com tanto dinheiro e longe de aplicar aos
concorrentes a violência empregada por outros traficantes, incluindo o
colombiano retratado nas telas do cinema, Cabeça Branca acumulou respeito no
crime. Um caminho que foi cimentado com muita discrição, diplomacia e com o
pagamento de valorosas mesadas. Segundo policiais federais, o bandido espalhou
corrupção comprando o silêncio daqueles que teriam o dever de detê-lo. A PF tem
informações de que o traficante teria no bolso um punhado de políticos no
Paraguai, incluindo na suspeita senadores e deputados; outros tantos no Brasil,
em especial na região de fronteira com o Paraguai. Teria comprado ainda, com
gordas propinas, servidores públicos estaduais e federais em Mato Grosso, Mato
Grosso do Sul, Paraná, Santa Catarina, Rio Grande do Sul e São Paulo, além de
supostamente pagar pelo apoio de funcionários dos portos de Santos e Itajaí,
por onde escoava sua mercadoria.
Para identificar toda rede usada pelo criminoso na
ocultação de bens, os policiais federais devem pedir esta semana a quebra dos
sigilos bancário e fiscal de cerca de 30 pessoas ligadas a Luiz Carlos da
Rocha. Um número ainda considerado pequeno. Na relação de alvos estão parentes
e uma rede de laranjas que o bandido usava para lavar sua fortuna. Na primeira
fase, a Justiça Federal autorizou o confisco de quatro apartamentos em
endereços nobres no Paraná e São Paulo; três casas em condomínios localizados nos
dois estados, uma fazenda em Ponta Porã e um terreno. Também foram alvos de
sequestro uma frota de veículos, como carros de luxo e caminhões usados no
transporte da droga. Em dois deles, os agentes localizaram cerca de 1,3
tonelada de cocaína escondida em fundos falsos. Os motoristas foram presos. (O
Globo)
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