JM Cunha Santos
O espírito Bita do Barão ficou confuso,
quase penalizado. Nunca tinha visto seu mestre daquele jeito, nunca tinha
percebido tanto desespero na voz embargada do pantomímico ex-senador. Nunca, em
nenhuma das vezes em que atendeu aos pedidos para despachar adversários
políticos para terras de Xangô ou vizinhas da Conchinchina, Sarney lhe pareceu tão
desesperado. Ele se contorcia, se debatia e, pela primeira vez, implorava.
- Me livra desse homem. Ele tá acabando
com tudo. Não tem mais agiotagem, não tem mais licitação fraudulenta, não tem
mais superfaturamento. O cara é um desastre político. O Flávio Dino tem que
cair.
- Misinfio, já lhe ajudei muito - Bita
do Barão respondeu. Já resolvi muito problema seu. Até lhe fiz presidente. Mas
há de convir que colocar mandinga em comunista cristão é uma tarefa muito
pesada, que talvez esteja muito além das minhas forças mediúnicas. Não sei se
meus cabocos vão dar conta. Vai sair muito caro. Vai ter que mexer naquela
poupança da Transpetro.
- Me ajude, eu pago. Já fiz de tudo.
Inventei escândalos, botei a mídia curupuana pra mentir até largar o couro da
boca, convoquei viúvas do DOI-CODI na Rede Globo, mas o cara nem se abala. Ele
tem que cair, ele tem que cair, faça alguma coisa.
- Não é tarefa pra qualquer Orixá. Tou
vendo aqui nos búzios que o cabra é protegido do Caboco Marxista e guardado
pelo manto das “entidades” sociais. São espíritos muito fortes, não sei se eu
posso enfrentar isso. Só se eu invocar Exu Caveira e com esse todo tipo de
infortúnio pode acontecer, até o feitiço virar contra o feiticeiro. Você quer
arriscar?
- Invoque todos os exus, todos os vodus,
todos os capetas dos mundos nus, as forças ocultas que puder. O que eu não
posso é suportar um sujeito que não usa a crise econômica como desculpa para
atrasar e reduzir os salários dos funcionários públicos, que paga professores
melhor que o país todo, que reduz a mortalidade infantil e a mortalidade
materna, diminui a criminalidade, promove policiais e equipa a polícia, limpa
as praias dos coliformes sarnentos e põe fim às terceirizações arranjadas e
chacinas no sistema penitenciário. Isso é a própria antipolítica, é demais para
a saúde de alguém como eu.
Meu jornal está falindo, não consigo
mais transferir nenhum milhãozinho do Estado para minha TV. Derruba o Flávio
Dino, eu imploro, por favor, derruba meu Rei!
- Misinfio, um pedido seu, bem pago, é
uma ordem.
E os tambores estrondaram desde a gruta
fantasma de Bita do Barão até os confins da África. O Palácio dos Leões
amanheceu cercado de poções malignas, de dentro das selvas disparavam orações
da cabra preta, rogaram tantas pragas e maldições sobre o Maranhão que até a
terra tremeu. Feitiços de afastamento, sarneisistas mal diagnosticados se
comunicando com os mortos, pentagramas surgindo nas secretarias de Estado,
maldições gritadas à meia-noite, velas pretas iluminando as artes escuras, de
tudo se viu no Maranhão naqueles dias.
E quando, numa sexta-feira 13, o
governador Flávio Dino se preparava para anunciar a construção de mais escolas,
caiu da cadeira. E Sarney, vendo tudo por sua TV que pode ser arrendada a
qualquer momento, lançou mais pragas e maldições, desta vez contra Bita do
Barão e seu séquito de espíritos ruins:
- Cambada de espírito burro, voltem
todos para as trevas. Ele tinha que cair do governo e não da cadeira.
E, aos prantos, olhando fixamente nos
olhos do deputado Hildo Rocha, começou um discurso que não acabaria mais:
Brasileiros e brasileiras, assim não
pode, assim não dá!
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