terça-feira, 15 de abril de 2014

A legislação a que Sarney pode recorrer para ser candidato ao Senado pelo Maranhão

JM Cunha Santos

 
A pulga não sai detrás da orelha. Indagado pelo repórter do jornal espanhol “El País” se seria candidato ao Senado, Sarney respondeu: “Eu preferiria (observem o tempo do verbo) descansar”. A disputa na base governista pela indicação para disputar o cargo virou tumulto. Arnaldo Melo foi indicado pelos deputados estaduais, Gastão Vieira reivindica a promoção e Manoel Ribeiro garante que a vaga é do PTB.
O capítulo IV da Constituição Cidadã de 1988, artigo 14:
A soberania popular será exercida pelo sufrágio universal e pelo voto direto e secreto, com valor igual para todos e, nos termos da lei, mediante:
Parágrafo 7:
São inelegíveis, no território da jurisdição do titular, o cônjuge e os parentes consanguíneos ou afins, até o segundo grau ou por adoção, do presidente da República, de governador de Estado ou território, do Distrito Federal, de prefeito ou de quem haja substituído dentro dos seis meses anteriores ao pleito, SALVO SE JÁ TITULAR DE MANDATO ELETIVO E CANDIDATO À REELEIÇÃO. (o grifo é nosso)
Se eu ainda sei ler e esse artigo ainda está em vigor, Roseana Sarney nem precisa renunciar para que seu pai tenha garantias legais de disputar o Senado restando, portanto, a questão do domicílio eleitoral.
E é aqui que a porca torce o rabo. Aqui se abrem as torneiras das interpretações e jurisprudências convenientes que rondam a legislação eleitoral.
O artigo 14 da CF, Parágrafo 3:
“São condições de elegibilidade, na forma da lei:
IV – O domicílio eleitoral na circunscrição.
Mas garante o Parágrafo Único do artigo 42 do Código Eleitoral:
“Para efeito de inscrição, é domicílio eleitoral o lugar de residência ou moradia do requerente e VERIFICADO TER O ALISTANDO MAIS DE UMA, (o grifo é nosso) considerar-se-á domicílio qualquer delas.
E Sarney tem residência no Maranhão, em Brasília e, quem sabe, até no Amapá.
E tem mais: O Inciso III, do artigo 55 preceitua:
“É requisito para a transferência de domicílio eleitoral a residência no mínimo de três meses no novo domicílio, atestada pela autoridade policial ou provada por outros meios convincentes”.
Embora para alguns juristas não se deva confundir domicílio eleitoral com domicílio civil, para outros são mais ou menos a mesma coisa. O legislador entende que o domicílio da pessoa natural é o lugar onde ela estabelece sua residência com ânimo definitivo. No caso de Sarney, o Maranhão. E o Código Eleitoral, não raro, fixa como domicílio eleitoral o domicílio civil.
Trata-se, inevitavelmente, de questão constitucional, a ser solvida no Supremo Tribunal Federal. E com esses ministros nomeados por Lula, Dilma e pelo próprio Sarney, no caso de uma impugnação o resultado é previsível. Muitas vezes assistimos o juiz substituir-se ao legislador para formular ele próprio a regra de direito aplicável. E quem disse isso foi o ministro Oscar Correia.
Um dos casos mais flagrantes em que a lei foi substituída pelo critério do juiz foi a cassação do falecido governador Jackson Lago, ato criminoso reconhecido anos depois, em outra decisão, pelo próprio STF.
Quando, em 1990, o PMDB negou legenda para Sarney ser candidato a senador pelo Maranhão, o Supremo Tribunal Federal garantiu sua candidatura pelo Amapá, a despeito de todas as impugnações fundadas no domicílio eleitoral. Pelo menos até então, a Constituição Federal de 1988 não estabelecia nenhum prazo para mudança de domicílio, é certo.
Podem até afirmar que esses argumentos não têm amparo legal, mas terão o efeito desejado nas mãos de um advogado esperto e com os ministros do Supremo nomeados todos por presidentes e ex-presidentes da República e quase sempre indicados pelo tráfico de influência vigente nas instituições. São mais uma oportunidade para que os senhores ministros do Supremo, a exemplo da cassação de Jackson Lago, se substituam à própria lei.

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