Em uma segunda liminar
sobre o caso nesta terça-feira 13, a ministra Rosa Weber, do Supremo Tribunal
Federal (STF), suspendeu o rito definido pelo presidente da Câmara, Eduardo
Cunha (PMDB-RJ), para dar sequência ao processo de impeachment contra a presidente
Dilma Rousseff no Congresso. O mandado de segurança 33.838 foi impetrado pelo
deputado federal e vice-líder do PCdoB Rubens Pereira Jr.
Mais cedo, o ministro
Teori Zavascki atendeu a um pedido do deputado Wadih Damous (PT-RJ) pelo
cancelamento do procedimento estabelecido por Cunha, que previa que, em caso de
rejeição do presidente da Câmara ao pedido, caberia recurso ao plenário, cuja
aprovação dependeria de maioria simples.
Abaixo, a íntegra da
decisão da ministra, publicada pelo portal jurídico Jota:
MEDIDA CAUTELAR EM MANDADO
DE SEGURANÇA 33.838 DISTRITO FEDERAL RELATORA : MIN. ROSA WEBER IMPTE.(S)
:RUBENS PEREIRA E SILVA JUNIOR ADV.(A/S) :PAULO MACHADO GUIMARÃES E OUTRO(A/S)
IMPDO.(A/S) :PRESIDENTE DA CÂMARA DOS DEPUTADOS ADV.(A/S) :SEM REPRESENTAÇÃO
NOS AUTOS Vistos etc.
O RELATÓRIO
1 – Trata-se de mandado de
segurança, com pedido de liminar, impetrado pelo Deputado Federal Rubens
Pereira e Silva Junior (PC do B/MA) contra ato do Presidente da Câmara dos
Deputados consistente no não recebimento do recurso por ele manejado contra a
Resposta oferecida pela autoridade coatora à Questão de Ordem nº 105, de 2015.
Sustenta-se na inicial que
tal indeferimento, ao inconsistente argumento da preclusão, se fez em clara
afronta ao art. 95, § 8º, do Regimento Interno da Câmara dos Deputados ("O
Deputado, em qualquer caso [diga-se, de deferimento ou indeferimento da
questão], poderá recorrer da decisão da Presidência para o Plenário, sem efeito
suspensivo, ouvindo-se a Comissão de Constituição e Justiça e de Cidadania, que
terá o prazo máximo de três sessões para se pronunciar. Publicado o parecer da
Comissão, o recurso será submetido na sessão seguinte ao Plenário"),
consubstanciando "violação à prerrogativa parlamentar" (inicial, fl.
2).
2 – Segundo o relato do
impetrante, a extensa Questão de Ordem nº 105, de autoria do Deputado Mendonça
Filho (DEM/PE), apresentada em sessão ordinária de 15 de setembro e reiterada
no dia seguinte, perquiria sobre o "trâmite de eventual processo e
julgamento por crime de responsabilidade contra a Presidente da República"
(inicial, fl. 2). A Resposta da autoridade coatora, a seu turno, desafiadora do
recurso não recebido do impetrante, foi oferecida em Plenário em 24.9.2015, e
ensejou o manejo, "imediatamente após a leitura", de recurso do
Deputado Wadih Damous", este recebido "de maneira inusitada"
pela autoridade coatora (inicial, fl. 3) como nova Questão de Ordem.
Ato contínuo ocorreu a
inscrição do impetrante, oportunidade em que informado pela autoridade coatora
"que falaria apenas após a apresentação de questão de ordem pelo deputado
Mendonça Filho, que, por sua vez, manifestou-se após a intervenção do Deputado
Chico Alencar" (inicial, fl. 3), ambos em pronunciamentos adstritos à
matéria trazida no recurso do Deputado Wadih Damous. Chegado o momento de sua
manifestação, reitera o impetrante ter recorrido contra a mesma Resposta à QO
nº 105, quando interrompido pela autoridade coatora à afirmação de que
"preclusa a matéria" porquanto "o momento para a interposição
seria ao final da leitura da Resposta" (inicial, fl. 3).
Acrescenta que a matéria
de fundo do presente mandado de segurança diz com o procedimento relativo à
tramitação de denúncias por crimes de responsabilidade, com eventuais reflexos
diretos sobre o mandato do Presidente da República. Pontua tratar-se de questão
de relevo tal para a manutenção do Estado de Direito, como organizado na
Constituição de 1988, que excede em muito a discussão meramente regimental ou
de interesse interno da Câmara dos Deputados. Argumenta que o art. 51, III e
IV, da Constituição Federal atribui às Casas Legislativas competência para
elaboração de Regimentos próprios não só para que se respeite a separação de
Poderes, mas também para "conferir previsibilidade e transparência aos
Parlamentares e cidadãos sobre os processos internos que culminarão com a
elaboração das leis" (inicial, fl. 5), do que se extrairia o direito
subjetivo, líquido e certo dos Deputados Federais de fazer cumprir,
judicialmente, as regras destinadas a assegurar a lisura da atividade
parlamentar, afastado qualquer ato tendente à arbitrariedade.
Afirma não ser possível
superar a ilegalidade praticada apesar do recebimento, pela mesma autoridade
coatora, de um segundo recurso contra a decisão relativa ao recurso originário
– atualmente na CCJ da Câmara -, por não dotado de efeito suspensivo e não
haver prazo para julgamento (inicial, fl. 10).
Destaca relacionado o
cerceamento sofrido a processo mais amplo, em que se pretende definir as regras
sobre o processo e julgamento da Presidente da República diante de suposto
crime de responsabilidade, por ato exclusivo do Presidente da Câmara dos
Deputados, que estaria evitando o pronunciamento das instâncias colegiadas da
Casa, seja por meio de consulta à CCJ, seja pelo não recebimento do recurso de
sua autoria ao Plenário e, na mesma sessão, do Deputado Wadih Damous.
O pedido de liminar, no
tocante ao perigo da demora, se baseia no fato de estar a autoridade coatora em
vias de decidir "sobre inúmeras denúncias de crime de responsabilidade
imputado à Presidente da República, e a qualquer momento poderá receber alguma
delas – ou contra a rejeição de alguma delas poderá algum parlamentar recorrer
– dando ensejo, assim, à aplicação do procedimento criado de maneira
autocrática pela autoridade coatora" (inicial, fl. 11).
3 – Os pedidos estão assim
deduzidos:
"(1) a concessão de
medida liminar para:
(a) suspender a eficácia
da resposta à questão de ordem nº 105 de 2015, até o julgamento do mérito deste
mandado de segurança;
(b) a concessão de medida
liminar para determinar à autoridade coatora que se abstenha de analisar
qualquer denúncia de crime de responsabilidade contra a Presidente da República
até o julgamento do mérito deste mandado de segurança;
(2) no mérito, a concessão
da segurança para que seja anulado o ato impugnado, determinando-se à
autoridade coatora que receba o recurso interposto pelo impetrante contra a
resposta à questão de ordem nº 105 de 2015, procedendo-se nos ulteriores termos
do Regimento Interno da Câmara" (inicial, fls. 11-12).
Requerida, ainda, a
posterior juntada de procuração ao advogado signatário da inicial, mercê da
urgência necessária à prática do ato.
Feito este breve relato,
EXAMINO.
O EXAME
4 – Defiro desde logo a
juntada, em até 15 (quinze) dias, da procuração em favor do advogado signatário
da inicial, nos termos do art. 37 e parágrafo único do CPC.
5 – Como reiteradamente
tenho enfatizado (v.g. MS 32.885, decisão monocrática de 23.4.2014), na esteira
da jurisprudência desta Suprema Corte e em respeito à independência dos Poderes
consagrada no texto constitucional, tenho pautado a minha atuação nesta Casa
pela máxima deferência à autonomia dos Poderes quando o conteúdo das questões
políticas em debate nas Casas Legislativas se reveste de natureza eminentemente
interna corporis e, nessa medida, se mostra estranho à competência do Supremo
Tribunal Federal (v.g., MS 32.033/DF, MS 31.475/DF e MS 31.444/DF, também de
minha relatoria). Abrem-se, contudo, as portas da jurisdição constitucional sempre
que em jogo o texto da Lei Maior, cabendo ao Poder Judiciário o exercício do
controle da juridicidade da atividade parlamentar. Nessa linha, ao Deputado
Federal esta Suprema Corte reconhece o direito subjetivo ao devido processo
legislativo e ao exercício pleno de suas prerrogativas parlamentares.
Faço tais registros porque
a controvérsia, na espécie, apenas aparentemente se circunscreve aos limites
das questões de natureza interna corporis, em especial no que diz com a
prevalência, ou não, do fundamento da preclusão expendido pela autoridade
coatora para indeferir o processamento do recurso do ora impetrante contra a
Resposta à Questão de Ordem nº 105/15, considerada a interposição em plenário
na primeira oportunidade em que a ele conferida a palavra, mantido em pauta o
assunto por força de acalorados debates, sem solução de continuidade, e
presente a impossibilidade fática de manifestação simultânea de vários
Deputados. Não há como desconsiderar, pelo menos em juízo precário de
delibação, a controvérsia como um todo, nos moldes em que posta no mandamus, a
ferir tema de inegável relevância e envergadura constitucional, pertinente à
definição das regras sobre o processo e o julgamento de Presidente da República
por crime de responsabilidade, objeto do art. 85, parágrafo único, da
Constituição, e a apontar dificultada a deliberação do Plenário sobre
incidentes a respeito. Visualizada nessa perspectiva, desvela-se, pelo menos em
juízo perfunctório, o caráter materialmente constitucional do seu conteúdo.
A DECISÃO
6 – Nesse contexto,
presente, o fumus boni juris, diante da iminência de exame pelo Presidente da
Câmara de Deputados de "inúmeras denúncias de crime de responsabilidade
imputado à Presidente da República", a ensejar aplicação do procedimento
criado na Resposta, impõe-se o deferimento da liminar para evitar o
comprometimento do pedido final deduzido ("concessão da segurança para que
seja anulado o ato impugnado, determinando-se à autoridade coatora que receba o
recurso interposto pelo impetrante contra a resposta à questão de ordem nº 105
de 2015, procedendo-se nos ulteriores termos do Regimento Interno da
Câmara").
Ex positis, forte no art.
7º, III, da Lei nº 12.016/09, diante de fundamento relevante e para prevenir a
ineficácia da medida, caso finalmente deferida, e com o caráter precário
próprio aos juízos perfunctórios, defiro a liminar para suspender a eficácia da
Resposta à Questão de Ordem nº 105, de 2015, bem como todos os procedimentos
tendentes a sua execução, até o julgamento do mérito do presente mandado de
segurança.
Notifique-se a autoridade
apontada como coatora para que preste informações, em dez dias (arts. 7º, I, da
Lei 12.016/09 e 203 do RISTF). Cientifique-se a AGU (art. 7º, II, da Lei
12.016/09). Após, vista ao Ministério Público Federal (arts. 12, caput, da Lei
12.016/09 e 205 do RISTF).
Publique-se.
Brasília, 13 de outubro de
2015.
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