quinta-feira, 14 de fevereiro de 2013

Bolsa poesia

JM Cunha Santos

Depois do Bolsa Novela não me parece incoerente, ou inconsistente, que o Governo Federal institua o Bolsa Poesia, com direito a projeto de lei aprovado no Congresso Nacional obrigando os beneficiários a gastarem com versos a renda transferida para se apropriarem das emoções dos poetas. Seria uma felicidade! Já imaginou, toda essa galera do Bolsa Família sendo obrigada a pagar para ler os versos ruins que escrevo. O lucro das emoções, finalmente, depois de tanto sofrimento!
Difícil vai ser abandonar a poesia analógica, assim como a ilógica; difícil vai ser estipular multas em emoções para quem não ler, por exemplo, “O Sentimento do Mundo” de Carlos Drummond de Andrade. E mais difícil ainda vai ser multar quem não entender. Daí até o Bolsa Big Brother e o Bolsa Ana Maria Braga, a distância é muito pequena, mas vale tudo na era digital.
É apenas uma idéia, mas já dá para ver o inferno erótico dos homens invadindo as auroras de todas as vidas. TV digital para todos, poesia digital para todos, novelas e novelões e haja Bombril nas antenas dos sentimentos humanos. E não deixa de ser uma grande jogada eleitoral, pois aliando o Bolsa Novela ao Bolsa Poesia o governo vai mexer na freqüência emocional de todo mundo, mudar a faixa de sintonia dos corações. Será o fim de todos os protestos, todas as decepções, posto que estaremos inteiramente interligados ao conversor de erros governamentais.
E imaginem só os efeitos colaterais dessa bolsa de emoções: a briga de Virgílio e Homero contra Elizabeth Jhin e Sílvio de Abreu, de Pablo Neruda e Baudelaire contra Emanuel Carneiro e Glória Perez, se encontrando no coração de um mesmo povo que mal conseguiu resistir às pressões do carnaval. Um verso, um verso só, digital e profético se espalhando nos ouvidos com a mesma proficiência do “Delícia, delícia, assim você me mata”. Que delícia! Como é delicioso governar o Brasil!

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