Banco cobra de senador dívida de um empréstimo em que foi dada como
garantia fazenda-fantasma
O Globo
Chico de Góis
Enviado Especial
Publicado em 19 de janeiro de 2013
SÃO LUÍS - Desde 2002 tramita na
Justiça do Maranhão uma ação que tenta cobrar do senador Edison Lobão Filho
(PMDB-MA) e mais três pessoas, uma delas mulher do parlamentar, o pagamento de
uma dívida calculada, na época, em R$ 5,5 milhões (no processo, não há valores
atualizados). Em 2009, inexplicavelmente, o processo foi arquivado, sem que
ninguém assim determinasse. No ano passado, ao descobrir o erro, o banco pediu
o desarquivamento, mas, mesmo assim, embora desde agosto de 2011 esteja
concluso, o processo continua parado.
O juiz que cuidava do caso, José de
Arimatéia Correia Silva, da 5ª Vara Cível de São Luís, foi aposentado
compulsoriamente em fevereiro deste ano pelo Conselho Nacional de Justiça
(CNJ). Arimatéia foi acusado de agir com parcialidade em várias ações.
No meio do processo, entre tentativas
de Lobão Filho de excluir seu nome como um dos fiadores de um empréstimo junto
ao Banco do Nordeste (BNB), a empresa da qual foi sócio tentou substituir as
garantias que havia dado por uma fazenda-fantasma.
Lobão Filho foi sócio da Bemar
Distribuidora de Bebidas entre 1996 e 1998. Em julho de 1997, a empresa
contraiu um empréstimo de US$ 648 mil —R$ 699 mil na cotação da época. O
dinheiro foi utilizado para a compra de caminhões — há pelo menos três em nome
do parlamentar. Como garantia pela liberação da verba, a Bemar não deu os
próprios veículos, como seria comum — deixou alienadas para o pagamento da
dívida 28.820 caixas de cerveja Schincariol.
O agora senador, sua mulher, Paula, e
as sócias Maria Luiza Thiago de Almeida e Ana Maria dos Santos aparecem como
fiadores do empréstimo que deveria ter sido pago em 30 prestações. A empresa,
porém, não honrou o compromisso, e, desde 2002, o BNB tenta penhorar os bens da
Bemar e dos fiadores.
Em 2008, quando Lobão Filho assumiu a
vaga do pai, que virou ministro de Minas e Energia, veio a público a história
de que ele havia transferido para uma empregada doméstica suas cotas da Bemar
para tentar fugir da cobrança da dívida. Ele negou que tivesse conhecimento de
que a sócia que entrava em seu lugar era uma laranja.
No decorrer do processo de cobrança
da dívida, a Bemar sugeriu trocar a garantia dada pelo empréstimo: em vez das
28.820 caixas de cerveja, apresentou uma fazenda de 20 mil hectares em Sento-Sé,
na Bahia, avaliada, segundo informava a empresa, em R$ 4,5 milhões. A
distribuidora de bebidas também procurou retirar Lobão e os demais ex-sócios da
condição de fiadores. No entanto, o BNB descobriu que a fazenda que a Bemar
disse ter adquirido em abril de 2002 por R$ 10 mil não existia.
A Bemar juntou avaliações que teriam
sido realizadas no mesmo mês da compra da fazenda que afirmavam que o imóvel
valia R$ 4,5 milhões. “Estranha-se, portanto, o fato de o imóvel sofrer uma
valorização de mais de 40.000% no mesmo mês”, anotaram os advogados do banco
num agravo de instrumento. O técnico do BNB que esteve no lugar enviou e-mail à
chefia da instituição atestando que a fazenda não existia.
O senador Edison Lobão Filho (PMDB)
negou que soubesse que era fantasma a fazenda que a Bemar Distribuidora de
Bebidas queria dar como garantia para pagamento da dívida. Lobão declarou ao
GLOBO que se arrepende de ter deixado a sociedade, porque, de acordo com ele, a
empresa, que era deficitária, agora é muito lucrativa.
O senador disse que quando entrou na
sociedade, em 1996, a empresa era pequena e faturava pouco. A Bemar, segundo
contou, trazia cerveja da Bahia para revender no Maranhão.
—Entrei como avalista, e as dívidas
começaram a se acumular. Com o tempo, fiz um acordo pelo qual eu saía sem nada,
mas os demais sócios assumiam todas as dívidas.
Ele afirmou que procurou o Banco do
Nordeste para retirar seu nome da condição de avalista, uma vez que já não era
mais sócio da empresa, mas o banco não aceitou.
— Eu procurei o banco e disse que a
empresa não havia falido e que meus ex-sócios estavam ricos. Pedi para
transferir a dívida para eles porque eu não tenho mais nada a ver com o
negócio.
O senador maranhense lamenta hoje sua
decisão de sair da sociedade.
— A empresa está muito maior do que
antes. Foi um péssimo negócio eu ter saído. Eles ficaram ricos com este negócio
— repetiu.
Para o senador, é estranho o banco
afirmar que a fazenda que seria dada como garantia não existe. Ele afirmou que
há um ano, ao conversar com Marco Aurélio Costa, um dos sócios da Bemar, este
lhe teria dito que havia comprado uma fazenda que havia valorizado demais.
— Ele afirmou que estava preferindo
fazer um acordo e ficar com a fazenda. Eu não tenho nenhuma fazenda porque não
gosto. Mas eles são grandes fazendeiros, têm diversas fazendas. Com toda a
grana da bebida, eles compraram fazendas. Vou procurá-los para saber o que
fizeram.
Lobão Filho disse que foi investigado
quando surgiram notícias de que teria vendido sua parte para uma laranja e que
nada foi provado contra ele.
— Até hoje estou pagando com a minha
imagem.
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