Editorial
JP, 29 de outubro
Ressaltavam
os anarquistas quão perigosos são os usos que o governo pode fazer do ensino
quando o tem sob controle. Essa reflexão serve para avaliar o exagero da mídia
em torno da inviável e perturbadora votação obtida por Dilma Roussef no
município de Belágua., algo em torno de 94 % de todo eleitorado. Tão retumbante
que talvez só coubesse como realidade numa obra de ficção de Gabriel Garcia
Marquez.
Bem
mais da metade da população de Belágua sobrevive às custas de R$ 184 do Bolsa
Família o que, na visão de apressados e desonestos analistas políticos,
representa uma vitória da distribuição de renda no Brasil. Mas o verdadeiro
nome dessa mensalidade é miséria, é pobreza extrema, é vida abaixo de qualquer
dignidade. Belágua é o melhor exemplo do uso perigoso da educação pelo governo,
pois sobra à evidência que o poder púbico não cuidou de educar ninguém por lá.
Na
televisão, Belágua surge como mais um município sem banheiros, sem saneamento
básico, sem água potável, sem estradas, onde crianças visivelmente atacadas de
“barriga d’água” aparecem nos holofotes da mídia como estatísticas da inclusão
social. Entretanto, na ressaca da mais disputada eleição do país, Belágua se
tornou referência de vitória dos programas sociais do PT. Belágua, no entanto,
só serve como exemplo do fracasso do Estado no gerenciamento da educação e da
saúde e do uso da miséria pública como matéria de desvirtuamento eleitoral.
Moradores
que deixaram a roça para viver na “cidade” foram entrevistados e contaram como,
depois do Bolsa Família, a vida se tornou melhor. Roças que não rendiam nem
sequer 184 reais por mês?! Roças que não podem ser roças, pois só revelam a
condição sub-humana do homem do campo do Maranhão. No entanto, a notícia de tão
absurda unanimidade eleitoral (94 %) corre o mundo e só não é mais espantosa
que a existência de pessoas que acreditam que melhoraram de vida porque seria
impossível a vida ser pior.
São
as roças de quem não tem terra para plantar, de que foi tangido pelo gado, pelo
bacamarte dos jagunços, por guardas pretorianas, por uma perversidade econômica
que eles não têm sequer como compreender.
Belágua
é apresentado como oásis de um partido político que poderia ser qualquer outro,
quando a cidade é tão-somente uma verdade cruel: a de que existem homens que
comem menos e pior que nossos cães. É a verdade da miséria onipresente no
Maranhão, do analfabetismo crônico, da mortalidade prematura e da pungente
desigualdade social no Brasil. Belágua não é uma verdade eleitoral; é um prêmio
à inversão de valores, à ausência do Estado que torna os ricos cada vez mais
ricos e os pobres cada vez mais pobres e retrato perfeito do engodo e da
mistificação.
Belágua
é a certeza da existência de muitas Beláguas nesse Estado e o exemplo mais
perfeito do irremediável fracasso da inclusão social no Brasil.
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