JM
Cunha Santos
Vagamos
muito pelos bares da vida, entupindo as almas de boemia e as cabeças de
notícias. Lauro Leite era um pouco o pai de nossas dúvidas, o maestro de nossos
desacertos e uma espécie de protetor dos corações desavisados dos poetas sem
nome nem futuro. Sempre sabia aonde ir; nunca sabia quando voltar. Mas quando
voltava trazia a todos que o acompanhavam como se para nos proteger de
desilusões.
Com
ele, a marca de uma geração tangida pelo espetáculo de viver a vida em toda sua
plenitude, sem crueldades, sem ofender, sem ferir, sem nunca magoar os que o
rodeavam. Lembro que soltava versos, tecia crônicas sobre o cotidiano de uma
São Luís que parecia morar em suas veias e que subia as escadarias da
Assembleia Legislativa, cada vez mais sólido e vagaroso porque só tinha pressa
de esperar a noite, a companheira de insônias incompletas que sempre sabia
aonde encontrar.
Senti
muito, todos sentiram, quando a saúde abalada não mais o permitiu ser o
filósofo de todos nós nas mesas compactas dos debates sobre o futuro, enquanto
se dividia entre ser o poeta de todos os dias e o jornalista de todas as horas.
Pobre
e probo, o alcance de suas mãos e de sua mente era a família, os filhos que
amava, as mulheres que o tiveram e um sonho comprido que mais se alongava
quando, mesmo sendo chefe, não repreendia, acalentava, não punia, justificava.
Sabia admirar de cada um o defeito e transformar em virtudes para que todos se
sentissem melhor.
Essa
lembrança do meu amigo sem ambições maiores que a de ter amigos, quase como a
querer fazer de todos que o rodeavam um parente próximo, torna nostálgica essa
passagem pelo mundo. Porque vivemos? O que viemos fazer aqui se logo iremos
embora? Serão mesmo as lembranças dos que nos amaram a última morada? E quanto
nos custa em dor não poder pagar para sempre o aluguel desse planeta?
De
qualquer modo, sua voz ainda está no rádio, ainda ecoa nos microfones da Rádio
Timbira, ainda supera suas angústias e as dos outros que, dentro dele, pareciam
ser as mesmas. É como se sua única ideologia fosse ser feliz, por mais que
doesse.
Era
preciso ouvir Lauro Leite antes de cometer erros; era preciso cometer erros
antes de ouvir Lauro Leite. O que o continha, entre o mundo político e o mundo
poético, entre a boemia destravada e a realidade brutal à nossa volta, era o
direito de continuar vivendo para sempre. O que, infelizmente, ele também não
conseguiu.
Adeus,
meu amigo. E informe a Deus sobre as coisas cruéis e tristes que andam
acontecendo por aqui.
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