Da revista Época
A
Fundação José Sarney ficou conhecida nacionalmente em 2009, quando surgiram
indícios de desvios de verba. Por meio da lei de incentivo à cultura, a
Petrobras repassara R$ 1,3 milhão para a fundação investir na preservação do
acervo de livros, documentos e obras de arte. A Lei Rouanet permite que uma
empresa deixe de recolher impostos para patrocinar eventos culturais. Por cinco
anos, o Ministério da Cultura – a quem cabe fiscalizar o uso dos recursos
-conduziu uma auditoria que ameaçava não ter fim. Em maio de 2013, o ministério
finalmente enviou a papelada para uma análise da Controladoria-Geral da União
(CGU).
A
conclusão da CGU – órgão encarregado de fiscalizar a gestão de recursos
federais – saiu no mesmo mês, mas permanecia inédita. ÉPOCA obteve o relatório
com exclusividade. Ele aponta o sumiço de R$ 522 mil, ou 38,7% do patrocínio da
Petrobras. Com juros e correção monetária, a fundação teria de devolver R$ 1,12
milhão ao Erário, segundo cálculos da CGU.
O
relatório traz uma série de irregularidades: uso de notas fiscais fraudadas ou
com prazo de validade vencido, sobrepreço, pagamentos por serviços nunca
prestados, falta de comprovação de gastos e despesas que nada tinham a ver com
a preservação do acervo. Todos os documentos reunidos formam um calhamaço de
quase 1.000 páginas que chegou em janeiro à mesa do procurador Marinus Marsico,
do Tribunal de Contas da União (TCU). Após parecer do procurador, o caso
seguirá para julgamento no TCU, a quem cabe a palavra final sobre os desvios.
Afundada
na denúncia de desvio de dinheiro, a fundação fechou as portas em 2009 e entrou
em liquidação. Ela fora criada pelo senador José Sarney (PMDB-AP) em meados de
1990. Sarney acabara de deixar a Presidência da República e queria reunir num
mesmo espaço os milhares de documentos de seu governo, os presentes que ganhara
no cargo, além de uma coleção que incluía 3.200 obras de arte e 37 mil livros.
O material ficou acomodado no antigo Convento das Mercês, um edifício do século
XVII tombado no centro histórico de São Luís.
A
auditoria do Ministério da Cultura atribui à fundação e a dois ex-diretores a
responsabilidade pelas irregularidades. Sarney não aparece entre os
responsáveis. Por meio de sua assessoria, ele disse que não exercia qualquer
função administrativa na fundação. Afirmou ainda que ela comprovou o
cumprimento das contrapartidas exigidas pela Petrobras.
O
acervo de Sarney continuou guardado no convento para, novamente, ser socorrido
com dinheiro público. Em outubro de 2011, a governadora do Maranhão, Roseana Sarney
(PMDB), assinou uma lei que, na prática, estatizou o patrimônio. Roseana
instituiu a Fundação da Memória Republicana Brasileira, vinculada à Secretaria
Estadual de Educação e sediada no mesmo edifício histórico. Sarney foi nomeado
seu patrono vitalício. Alguns meses depois, ele doou formalmente livros,
documentos e obras de arte para compor o acervo da nova fundação.
Ao
custo anual de R$ 3,2 milhões, o governo do Estado do Maranhão assumiu a
responsabilidade de zelar, conservar e ainda expor ao público todo o material.
Agora, a fundação não depende mais de patrocínio privado. Mas talvez ainda
tenha de devolver dinheiro.
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